Uma Viagem pela Memória das Vozes que Marcaram Gerações

Uma Viagem pela Memória das Vozes que Marcaram Gerações

 

 

A magia do rádio quando criança e adolescente.

Saudosas recordações.

 

 

 

 

Na minha infância, o esporte era mais do que um espetáculo – era uma experiência que vivíamos intensamente, dentro e fora de campo.

 

 

Quando não conseguia estar presente nas partidas nos estádios Vidal Ramos Júnior ou Vermelhão de Copacabana, sintonizava o “Rádio Semp” de casa para acompanhar as transmissões do meu time favorito, o Guarani, ou do colorado lageano nos amistosos e nas competições da Liga Serrana de Futebol e do Estadual Catarinense.

 

Desde adolescente, o rádio me fascinava. Radionovelas, transmissões de futebol e análises esportivas eram minha paixão. Quase podia me imaginar como locutor. Enquanto ajudava meu pai no comércio, fazendo compras no centro da cidade, eu visitava a Rádio Diário da Manhã para observar os bastidores. Ficava impressionado com a produção das radionovelas, os comentários esportivos e a veiculação das notícias.

O rádio, tal como o telefone, o avião e o automóvel, é uma das inovações que teve um impacto significativo na sociedade do século passado, alterando a maneira como as pessoas viam o mundo ao seu redor. Era difícil imaginar que um som emitido pelo rádio poderia viajar longas distâncias, alcançando simultaneamente os ouvidos de tantas pessoas.

Programas que marcaram época

 

Clássicos como Repórter Esso, Grande Jornal Falado Tupi, Grande Jornal Falado Rádio Clube de Lages, Grande Rodeio, Alma Cabocla, Deixa que Eu Chuto, Domingo Esportivo e Mesa Redonda eram aguardados com expectativa e emoção.

 

O historiador Eric Hobsbawm ressaltou que, já na década de 1930, o rádio emergia como uma poderosa ferramenta informativa capaz de atingir milhões de pessoas de forma individualizada.

A voz que emociona: o papel do locutor

 

No rádio, a locução sempre foi essencial. O locutor não apenas descreve: ele informa, comenta e transmite emoções. Sua voz tem o poder de transformar fatos em experiências vividas.

 

Personagens Inesquecíveis

 

Al Neto (Afonso Ribeiro Neto)

Trata-se de um renomado  lageano  do rádio. Atuou como repórter na Unit Press, em parceria com a BBC de Londres, apresentando o programa “Nos bastidores do Mundo”, fenômeno nacional na década de 1950.

Hélio Aquino

Comentava futebol com inteligência e eloquência. Além da carreira no rádio, trabalhou no Banco do Brasil e posteriormente na Justiça do Trabalho. No Serrano Tênis Clube, dedicou-se ao esporte, especialmente o tênis, por três décadas.

 

Inah Oliveira Costa

 

Com voz suave e marcante, brilhou como locutora, rádio-atriz e apresentadora entre os anos 1950 e 1980. Atuou nas rádios Diário da Manhã, Princesa e Difusora, além de apresentar eventos sociais no Centro Cívico Cruz e Souza.

 

 

Armindo Antonio Ranzolin

Em 1956, Ranzolin fez sua estreia como locutor esportivo na Rádio Diário da Manhà de Lages, cobrindo partidas da Liga Serrana de Futebol  envolvendo clubes como Aliados Futebol Clube, Esporte Clube Internacional, Grêmio Esportivo Vasco da Gama e Lages Futebol Clube. No ano seguinte, dirigiu-se a Porto Alegre para cursar Ciências Jurídicas e Sociais na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Em 1959, iniciou sua carreira jornalística na Rádio Guaíba  como locutor comercial e redator. No mesmo ano, foi contratado pela concorrente Difusora como repórter e posteriormente se destacou como principal narrador esportivo.

Ranzolin foi um dos maiores locutores esportivos do Brasil. Conquistou renome nacional na Rádio Gaúcha e na RBS, narrando inclusive o histórico Grêmio x Ajax no Mundial de 1995.

Camargo Filho (Nadir Santos Camargo)

Um profissional laureado do rádio esportivo serrano. Natural de São Borja – RS, estabeleceu-se em Lages em 1950, onde exerceu  a atividade de radialista  esportivo até a sua aposentadoria na Rádio Clube de Lages.

Posteriormente a saída da Rádio Clube, Camargo passou e exercer a função de  assessor de imprensa na Câmara de Vereadores de Lages.

Era uma figura apaixonada pelo futebol, torcedor do Inter de Lages e criador do jargão “Gua-Nal”, que marcou os clássicos locais. Foi também presidente interino do Inter em 1980 e pioneiro ao narrar os Jogos Abertos de Santa Catarina em 1960.

Camargo inaugurou uma nova era no jornalismo serrano ao transmitir partidas do Campeonato Brasileiro, narrando jogos em renomados estádios do Brasil, como o Maracanã, Morumbi, Mineirão, Olímpico e Beira-Rio.

Ele  ofereceu aos ouvintes da serra experiências inesquecíveis através de entrevistas com figuras renomadas, como Pelé, além dos artistas Ângela Maria, Cauby Peixoto e Nelson Gonçalves. Entre os políticos que foram entrevistados pelo Camargo destacam-se Carlos Lacerda, que na época era governador do Rio de Janeiro; o Presidente João Goulart; e o Senador Tancredo Neves.

Aldo Pires de Godoy

Aldo Pires de Godoy foi um renomado narrador esportivo e comunicador versátil, que marcou época no rádio catarinense. Reconhecido pela emoção que transmitia em suas locuções, protagonizou momentos inesquecíveis, como quando se deixou levar pela atmosfera do Estádio Vidal Ramos Júnior e do Estádio Vermelhão de Copacabana. 

Além do microfone, também atuou como colunista e tornou-se referência no jornalismo esportivo de Santa Catarina.

Sua carreira profissional começou na Rádio Diário da Manhã, em Lages, onde iniciou como narrador esportivo. Posteriormente, passou pela Rádio Princesa e pela Rádio Clube de Lages, estendendo sua atuação para diversas outras emissoras do Estado, além de experiências também na televisão.

Por muitos anos, a abertura das jornadas esportivas da Rádio Clube de Lages era marcada por um jingle que embalava o público:
“É bola no chão, é bola no pé, é bola no ar, é bola na rede pra você vibrar…
E a nossa equipe que é a mais forte vem aí pra falar de esporte…”.

Em uma partida do Internacional, sua voz inconfundível eternizou um dos lances mais lembrados pelos ouvintes:
“… Daniel chutooou, bateu no poooste!, voltou para Daniel, bateu é gol! Goooooooooooooooollll do Internacionaaallll…”.

Com seu estilo vibrante e carismático, Aldo Pires de Godoy consolidou-se como uma das vozes mais marcantes da crônica esportiva catarinense.

Luiz Zanella Sobrinho

Durante 46 anos, foi a voz emblemática do Show da Manhã e do Grande Jornal Falado da Rádio Clube de Lages. Encerrava o dia com a emocionante “Ave Maria” às 18h, tornando-se parte da rotina afetiva de milhares de ouvintes.

 

Servilho Ferreira (Luiz Alves Ferreira)

Com estilo irreverente, conquistou popularidade com o bordão “Servilho Ferreira, desde pequenininho, se tiver outro, é falso.” Foi repórter esportivo e policial, apresentador do popular “Onde Canta o Sabiá”, sempre polêmico e inovador.

Evaldir Nascimento

Radialista dedicado por 34 anos à Rádio Clube de Lages, liderou equipes esportivas e chegou a presidir a Fundação Municipal de Esportes. Ético e comprometido, deixou legado duradouro no rádio e no esporte da Serra Catarinense.

 

 

Cláudio Odair José de Oliveira

Atuou em várias rádios serranas e na Assessoria de Comunicação da Prefeitura de Lages por 20 anos, com humildade e profissionalismo.

 

Celso Aurélio

Versátil radialista e jornalista esportivo, trabalhou em diversas rádios e jornais. Criador do bordão “Todos passarão e eu passarinho”, marcou época também com sua coluna no Correio Lageano e a revista CA Esportes.

 

Conclusão – O legado do rádio lageano

Os profissionais aqui rememorados representam mais do que vozes de um período específico: constituem parte fundamental da construção da identidade cultural de Lages e da Serra Catarinense. O rádio, especialmente entre as décadas de 1930 e 1960, exerceu papel central como meio de comunicação de massa, sendo capaz de integrar comunidades urbanas e rurais, difundir valores sociais e consolidar práticas culturais.

Nesse contexto, os locutores não se limitaram à função técnica de narrar acontecimentos. Tornaram-se mediadores entre o fato e o público, responsáveis por atribuir sentido e emoção às transmissões. Seu trabalho contribuiu para a formação de vínculos coletivos, fortalecendo o sentimento de pertencimento regional.

O legado desses comunicadores permanece presente na memória social. Suas vozes, ainda lembradas, constituem registros vivos de uma época em que o rádio não apenas informava e entretinha, mas também desempenhava função estruturante na vida comunitária. Assim, o rádio lageano deve a esses profissionais parte significativa de seu reconhecimento histórico e cultural.

walmor1953@gmail.com

 

Fontes:

BARBOSA, Marialva. História cultural da imprensa: Brasil, 1900–2000. Rio de Janeiro: Mauad, 2007.

FERREIRA, Jorge; DELGADO, Lucilia de Almeida Neves (Orgs.). O Brasil Republicano – O tempo da experiência democrática: da democratização de 1945 ao golpe civil-militar de 1964. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003.

HOBSBAWM, Eric J. Era dos extremos: o breve século XX (1914-1991). São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

KISCHINHEVSKY, Marcelo. Rádio e mídias sociais: mediações e interações radiofônicas em plataformas digitais de comunicação. Rio de Janeiro: Mauad X, 2016.

MOREIRA, Sonia Virgínia. Rádio no Brasil: uma história em construção. Rio de Janeiro: EdUERJ, 1991.

NUNES, Márcio de Souza. O rádio catarinense: história e memória. Florianópolis: Editora da UFSC, 2002.

SCHRAMM, Wilbur. Comunicação de massa e desenvolvimento. Rio de Janeiro: Zahar, 1971.

SILVA, Mário Luiz Neves de Oliveira da. História da comunicação em Santa Catarina. Florianópolis: Insular, 2012.

CORREIO LAGEANO. Diversas edições históricas. Lages, SC.RÁDIO CLUBE DE LAGES. Arquivos e registros sonoros. Lages, SC.

MEMÓRIA oral de ex-radialistas e ouvintes da Serra Catarinense.

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